Estava a pensar no que se
está a passar no actual Benfica quando me lembrei de um episódio do nosso
futebol. Certo dia, perguntaram a Carlos Manuel, no já longínquo ano de 1997,
qual o segredo para o bom futebol que a equipa treinada por si na altura, o
Salgueiros, apresentava, já que o plantel era praticamente o mesmo da época
anterior. Carlão respondeu de forma descontraída, dizendo que o principal era
que os jogadores tinham prazer em jogar futebol e se divertiam a fazê-lo.
Parecia uma resposta evasiva a qualquer segredo táctico mas continha em si uma
grande verdade por vezes esquecida. Um conjunto de jogadores descontraído
treina melhor durante a semana e joga melhor quando chega a altura dos jogos,
isto quando comparado com o mesmo conjunto pressionado, claro está, já que a
valia individual e a organização colectiva continuam a ser os pilares de uma
boa equipa. Voltando ao Benfica, penso que está hoje no extremo oposto ao
episódio descrito. Os principais jogadores da época passada ficaram, as lacunas
do plantel foram resolvidas com a contratação de novos jogadores, o treinador é
o mesmo, o sistema táctico usado não foge aos sistemas tácticos usados
anteriormente, mas o futebol apresentado é muito diferente. Para pior. A
equipa rende menos, parece amarrada e
até a grande vertigem dos seus jogos de épocas anteriores, causada pela velocidade
que impunha ao seu jogo, desapareceu. Não me parece que os jogadores estejam de
cabeça limpa e os episódios de indisciplina vão-se acumulando, como se viu no último
jogo em casa, frente ao Gil Vicente em que Gaitan reage mal a ser substituído e
onde o capitão Luisão se desentende com os adeptos, protestando com estes de
forma bem visível. O que se passa é que a equipa está pressionada.
Tantas vezes a grande força do Benfica, os adeptos são também o seu maior inimigo |
O final da época passada
foi terrível para o Benfica. Após ter chegado ao final da época a disputar três
competições, apresentando legítimas aspirações de as vencer a todas, acabou por
não ganhar nenhuma. Talvez mais do que isso, aos adeptos doeu a forma como as
perdeu. O campeonato em pleno Estádio do Dragão frente ao grande rival FC
Porto, sofrendo o golpe fatal nos descontos de um jogo eléctrico, perdendo a
final da Liga Europa, de novo nos descontos e sendo derrotado na final da Taça
de Portugal por um Vitória de Guimarães que nunca se mostrou superior. E aqui,
no Jamor, talvez por ter sido o último jogo da época, caiu a gota de água que
fez transbordar o copo. Cardozo desentende-se com o treinador Jorge Jesus à
frente de todos e os adeptos mostram claramente que perderam a paciência. Jorge
Jesus, após quatro anos ao leme da equipa, parece ter perdido todas as
condições para o continuar a fazer. Neste
ponto começa a responsabilidade da direcção do Benfica, talvez a principal
culpada da situação actual em que a sua equipa de futebol está envolvida. Luís
Filipe Vieira e seus pares deveriam ter tomado uma posição forte e,
principalmente, rápida no que respeita à manutenção ou não da equipa técnica.
Pelo contrário, deixou arrastar a decisão, deixando que se transformasse num
caso, amplamente explorado pelos media e que foi criando uma divisão nos
adeptos encarnados, aumentando o número e o ruído dos que pediam a sua saída. Acabou por decidir manter o treinador renovando o seu contrato por mais dois anos
mas o mal estava feito. Os muitos adeptos que pediam a sua cabeça estavam agora
à espera que falhasse de novo para se voltar a manifestar.
Cardozo interpela Jorge Jesus após a derrota na Taça de Portugal |
De seguida, acaba
por não ser célere a resolver o caso Cardozo. Após o que aconteceu no final do
jogo do Jamor, entre Cardozo e Jorge Jesus, dificilmente seria de esperar que
ambos se mantivessem no clube e, após a renovação do treinador, ficou claro que
Cardozo teria de sair. Mais uma vez, a direcção do Benfica não foi firme na
resolução deste caso, talvez com medo de perder um activo do clube por pouco
dinheiro, e deixou-o empolar, de novo dividindo os adeptos, agora de forma
muito mais desequilibrada, com a maioria a pedir que o paraguaio fique no clube,
algo que ainda nem ficou totalmente decidido. Com isto, gerou-se uma pressão
enorme sobre o Benfica que ficou proibido de errar. Essa pressão sentiu-se na
pré-temporada onde a equipa jogava jogos amigáveis sobre brasas, muitas vezes
assobiada pelos próprios adeptos que não lhe davam qualquer margem de erro. Os
resultados de jogos da pré temporada, coisa que normalmente, pouco interessa,
tornaram-se grande motivo de análise e mais uma vez o rendimento da equipa foi
questionado.
Treinador e equipa têm estado debaixo de uma intensa pressão |
Não foi, assim, surpresa a
forma como o Benfica se apresentou para o seu primeiro jogo oficial frente a um
difícil Marítimo. Jogou sem dinâmica ofensiva e com muito nervosismo defensivo
e o resultado foi uma derrota à primeira jornada. Neste momento, já o Benfica
se assemelhava a uma panela de pressão, com esta sempre a aumentar e com os
seus intervenientes principais no papel de ingredientes, a serem cozinhados por
uma massa associativa que já não tolera mais falhas. O Benfica precisava de
vitórias urgentemente e a primeira aconteceu em casa, à segunda jornada. Mas a
vitória, aqui, já não chegava. O Benfica precisava de uma vitória clara, sem
contestação mas, mesmo tendo sido amplamente superior a um Gil Vicente que
pouco atacou, viu-se a perder, sofrendo golo num lance algo caricato, que transmitiu
a ideia de ter acontecido devido ao nervosismo dos jogadores, e acabou por
vencer o jogo marcando dois golos no período de compensação. A vitória tirou
alguma pressão à panela mas não a suficiente. Esta ainda cozinha. Sem a
celeridade na resolução dos casos acima descritos, a direcção do Benfica acabou
por fazer com que o final da época de 2012/2013, se tenha arrastado para o
principio da época de 2013/2014, quase come se fossem a mesma temporada.
Alvalade será o palco de um derby que promete ser explosivo |
E agora, chegando à
terceira jornada, o Benfica entra num verdadeiro campo minado. A ida a Alvalade
para enfrentar um Sporting líder do campeonato e extremamente motivado,
apresenta-se como uma armadilha tremenda e ameaça fazer rebentar a panela de pressão,
com possíveis consequências para a sua equipa técnica e para as aspirações ao
título. Mas aqui, apresenta-se também a oportunidade dourada de esvaziar a
pressão e relançar uma candidatura ao título de forma definitiva. Para o fazer,
o Benfica teria de ir a Alvalade e derrotar o seu eterno rival e isso não se
afigura tarefa fácil. Olhando para a valia individual de ambas as equipas, o
Benfica tem condições para o fazer mas, para isso, tem de conseguir entrar em
campo de cabeça limpa e aqui está, talvez, o maior desafio de Jorge Jesus. Conseguirão
as águias abrir a panela de pressão ou esta explodirá nas suas mãos? O derby
desta jornada poderá conter a resposta.